Joana Vasconcelos. Sem Rede
Promovida pelo Museu Coleção Berardo e comissariada por Miguel Amado, Sem Rede foi a primeira exposição antológica de Joana Vasconcelos. Reunindo cerca de trinta e cinco obras elaboradas nos últimos quinze anos, este projeto traçava uma panorâmica do seu trabalho e constituiu, assim, uma oportunidade única para o conhecer ou redescobrir aprofundadamente.
Vasconcelos interpreta o mundo atual através de uma singular leitura das mentalidades, mitologias e iconografias da sociedade de consumo. Inspirando-se no imaginário comum, a artista analisa distintas problemáticas da vida diária. Assim, sob um impulso alegórico e ato derrisório, desconstrói os valores, hábitos e costumes da civilização ocidental para comentar a existência do presente, enquadrar o legado do passado e perspetivar os caminhos do futuro. Cruzando tradição e modernidade, inconsciente coletivo e história e sublime e simbólico, questiona a identidade, releve esta do género, da classe ou da nacionalidade. As suas obras combinam referências culturais (desde movimentos artísticos a expressões correntes), objetos quotidianos com valor sígnico (tais como espanadores, blisters de comprimidos, tampões higiénicos, utensílios domésticos, talheres de plástico e panelas e respetivas tampas) e materiais e técnicas populares (como a azulejaria e as faianças Bordalo Pinheiro ou o tricô e o croché). Engenhosamente manipulados, estes elementos atenuam o seu sentido e compõem uma nova forma, cujo significado recontextualiza a instância original e, assim, reflete a experiência entrópica caraterística da condição contemporânea.
Vasconcelos aproxima-se dos princípios do Nouveau Reálisme, movimento artístico francês fundado em 1960 que, adotando as estratégias vanguardistas de Marcel Duchamp (especialmente a do readymade), difundiu técnicas como a assemblage, baseada na justaposição de objets trouvés. Porém, equacionando a precariedade dos materiais professada pelo Nouveau Reálisme à luz de uma crítica do signo, a artista declina a estética pobre por este professada e propõe um retrato do quotidiano assente no simulacro da realidade. Este processo desenvolve-se através de vários efeitos estilísticos: a citação e a apropriação; a desfuncionalização de mercadorias; a representação, em grande escala, de imagens preexistentes; a exploração da arquitetura ao nível da monumentalidade, a especificidade do lugar e da organização espacial; a mise-en-scène; a serialidade da produção; a qualidade cinética da obra; a sua ativação pelo espectador; a acumulação e associação cromática dos seus componentes; a utilização de jogos de linguagem enquanto recurso expressivo.
Sem Rede contempla obras famosas como A Noiva (2001-2005), o conjunto Coração Independente (2004-2008) e Marylin (2009). Estas obras debruçam-se sobre a condição feminina, tema transversal à actividade da artista. Efetivamente, de Flores do Meu Desejo (1996-2009) a Vista Interior (2000), passando por Wash and Go (1998) ou o duo Sofá Aspirina (1997) e Cama Valium (1998), é o debate acerca do estatuto da mulher que estas obras exprimem. Contudo, a exposição inclui outras obras, menos mediatizadas, que articulam múltiplos assuntos com cunho político-económico. Refiram-se, por exemplo, a ideologia corporativa (Ponto de Encontro, 2000), a ostentação de classe (Menu do Dia, 2001), o exercício deslumbrado do poder (O Mundo a Seus Pés, 2001), a intolerância religiosa (Burka, 2002) e o estado securitário (Una Dirección, 2003). Obras recentes protagonizam reflexões com caráter político, como o conflito entre o progresso tecnológico e a conservação da natureza [Jardim do Éden (Labirinto), 2010] ou a doença enquanto metáfora da malaise global (Contaminação, 2008-2010). Em Sem Rede, a prática de Vasconcelos apresenta-se, pois, sob uma óptica inovadora, que não só desafia as abordagens dominantes da sua arte, mas também recria o seu especial universo como nenhuma outra exposição o fez até hoje.
Joana Vasconcelos (Paris, 1971; vive em Lisboa) estudou na escola Ar.Co, em Lisboa, e expõe regularmente desde meados da década de 1990. Crescentemente aclamada pela crítica e o público, tanto em Portugal como no estrangeiro, a sua trajectória afirma-a como uma das mais importantes artistas portuguesas da sua geração. A sua prolífica carreira inclui, por exemplo, exposições individuais em instituições como o Museu de Serralves (2000), a participação em eventos como Bienal de Veneza (2005), encomendas de intervenções no espaço público, como o Jardim Bordallo Pinheiro (Museu da Cidade, Lisboa, 2010) e galardões como The Winner Takes It All (Museu Coleção Berardo, 2006). Mais recentemente destacam-se a sua exposição individual no Palácio de Versalhes, em França (2012), e a escolha do seu nome para representar Portugal na Bienal de Veneza de 2013.
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