MATTER FICTIONS

Contando uma história parcial da nossa relação com a matéria, esta exposição explora a forma como o cruzamento entre narrativas cosmológicas, as revoluções espaciais da poesia concreta e as ficções hipertextuais e territoriais pode ter impacto no reconhecimento da agência humana num tempo que exige a nossa intervenção perante as alterações climáticas.

Com o aparecimento de algoritmos genéticos, a força descolonizadora da resistência poética previu o impacto viral da programação e as suas consequências no mundo físico. Com a libertação do signo, gerações de ciber-utopistas e poetas, abriram caminho para a compreensão da potencialidade da linguagem como veículo de turbulência e entropia material. E, ao passo que nos tornámos sensíveis às propriedades fluidas do código como subconsciente tecnológico da realidade, começámos a interrogar-nos sobre as causas da transformação planetária e a contestar o uso predatório e extrativista da matéria. De igual modo o determinismo tecnológico e o trabalho maquinal eliminaram a possibilidade de uma democracia terrestre. A extração abusiva de recursos despreza qualquer compreensão do tempo geológico e de ontologias não-humanas - sejam elas vegetais, animais ou minerais - ignorando o reconhecimento da nossa cumplicidade com a matéria. Mas como poderemos nós navegar neste espaço liminar e pensar sobre nós próprios como agentes responsáveis?

À medida que o mundo se encontra progressivamente sujeito a algoritmos preditivos, os artistas ganharam uma consciência apurada dos circuitos metabólicos da matéria, da sua agência e potencial, enquanto catalisadores de transformações económicas e biopolíticas. O seu conhecimento revelou-se alquímico, ao atuarem como conversores de ecologias planetárias e dinamizadores indispensáveis de uma agência coletiva. Que possamos aprender com eles a reposicionar-nos ontologicamente no mundo, interrogando de que forma a matéria é transformada ao ritmo de uma corrente de lava.
 

Margarida Mendes
Curadora da exposição